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(homenagem ao trabalho carcerário do Exército de Salvação)
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Em 1982, viajando para a Austrália, visitei São Francisco e Los Angeles, na Califórna. Tomando o avião em Chicago, para São Francisco, foi bonito sobrevoar as famosas Montanhas Rochosas. De repente houve um anúncio de que nosso vôo, por motivos técnicos, precisava fazer uma escala em Las Vegas. Sobrevoamos a cidade no meio do deserto e assim "a conheci".
Sobrevoando as Montanhas Rochosas
Sobrevoando Las Vegas, em pleno deserto de Nevada.
Depois de uma hora sem termos desembarcado em Las Vegas, prosseguimos viagem a São Francisco-CA, onde me esperava o colega coreano que me hospedou.
Na foto, na famosa "rua mais torta do mundo". Em outro dia, visita ao Fisherman's Wharf. A imperdível viagem de bonde pelas ruas íngremes da cidade. Mas o que mais me atraia a curiosidade: a turnê à Ilha de Alcatraz que pode ser vista ao fundo na foto do postal que mostra o bonde.
Alcatraz, que significa pelicano em espanhol, uma prisão desativada em 1963.
A chamada Main Street, Rua Principal do grande presídio.
Celas de presidiários famosos são mostradas pelo guia. A seta mostra a cela de
Al Capone.
Em dado momento da visita, fomos convidados, de dois a dois, a entrar em uma solitária. Quando a porta se fecha atrás de nós, na escuridão total segundos parecem horas.
Foi-nos mostrada a cela de Robert F. Stroud, no terceiro andar, o famoso encarcerado que criava pássaros, cuja história foi levada às telas no filme noir The Birdman of Alcatraz, de 1962, com Burt Lancaster. O Google poderá informar o leitor a respeito dessa história, mostrando inclusive foto do verdadeiro homem que cuidava de pássaros.
A mais famosa história de Alcatraz é a do homem que tentou escapar da ilha infestada de tubarões à volta. "Fuga de Alcatraz", de 1979, teve como ator principal Clint Eastwood.
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E mencionando cinema, na sequência desta postagem trataremos da Ilha do Diabo, por onde passou o célebre "Papillon", interpretado no filme do mesmo nome, de 1973, por Steve McQueen, tendo como ator coadjuvante Dustin Hoffman (foto).
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Livro da União Cultural Editora Ltda., quem sabe encontrado nos sebos.
Em 1962, às vésperas de ingressar no Exército de Salvação, li um livro da biblioteca pessoal de meu pai com o título "A Conquista da Ilha do Diabo", do original francês Conquêtes en Terre de Bagne, da autoria de Charles Péan, procurando inteirar-me a respeito dessa organização a nível mundial - pois só a conhecia de minha cidade, das visitas que meu pai fazia ao orfanato local para mostrar filmes do cinema mudo aos meninos (postagem com o título "Encontro com Victoria Chaplin, filha de Charles Chaplin").
Um livro que trata de leis penais da época na França, do trabalho desenvolvido pelo Armée du Salut entre os condenados, muitas estatísticas de repatriados, havia, porém, trechos muito humanos e emocionantes que tocaram fundo o meu coração, crescendo a convicção de que ao ingressar nesse Exército eu estava dando um passo certíssimo, passo do qual nunca me arrependi.
Charles Péan - 1901-1991
Em 1928, o jovem salvacionista Charles Péan (em foto dos anos 70) foi enviado ao presídio de Caiena, na Guiana Francesa, com uma missão específica vinda direta dos líderes internacionais do Exército de Salvação, que incluía:
- obra de salvação para os condenados,
- criação de uma colonia para os liberados,
- sendo possível, reconstituição de lares, permitindo às mulheres irem ter com os maridos se o liberado não puder voltar,
- o repatriamento dos que terminaram a pena.
O livro de sua autoria, escrito na década de 50, mostra que a sua missão, com a ajuda de Deus, foi cabalmente cumprida e, no ano de 1939, 3000 liberados voltaram à França graças ao trabalho árduo dos componentes do Exército de Salvação e sua "insistência santa" junto às autoridades penais tanto na França quanto na própria Guiana.
Difícil é fazer um resumo do livro, que trata também de estatísticas precisas, mas destaco três episódios emocionantes que mostram o calibre de fé e dedicação dos que lá trabalharam.
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éEle havia matado o seu próprio filho ainda bebê...
"Uma noite, o liberado Lacour está ajudando a capitã. Ele gosta do Exército de Salvação e sempre que pode vai ajudar os oficiais. É um homem de boa família e, com sua boa educação, uma companhia agradável para os oficiais. Entretanto, cometeu um crime horrível. Como é que um homem tão educado, tão sensível, pode afogar o filho que teve de uma criada da casa de sua família? Será que ele se arrependeu desse ato abominável?
Nessa noite, ele servia refrescos, enquanto a capitã distribuia os jogos, livros e discos aos cinquenta liberados que se achavam na sala. O bebê da capitã estava perto, deitado no carrinho. Abre-se a porta do restaurante e chamam:
- Capitã, o capitão está chamando a senhora lá em cima.
- Já vou, diz ela. Depois de breve hesitação, pede a Lacour: - Tome conta de meu filhinho!
Quando voltou depois de alguns minutos, encontrou-o ajoelhado diante da criança, com o rosto coberto de lágrimas.
- Que miserável sou eu! - diz ele soluçando, e a capitã procura consolá-lo.
Vendo a criança adormecida, ele compreende o seu pecado. No sorriso da mãe antevê o perdão de Deus.
Tirar da alma do presidiário o terrível castigo é a verdadeira solução.
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Entre os prisioneiros leprosos...
O capitão e eu atravessamos uma sala do hospital de St-Denis, ocupada por leprosos. É tal o mau cheiro que sentimos náuseas e o calor torna a atmosfera irrespirável.
- Major Péan, grita um homem levantando-se no catre.
Que angústia no seu olhar! Mas a aparência é de saúde.
Reconheço-o como um dos liberados cujo nome consta na lista do próximo embarque.
- Você aqui?
- Veja o que me acontece...
E ele rompe em soluços. No exame médico exigido para o repatriamento, o médico constatou o mal.
- Há quatorze anos venho esperando pelo dia da partida! E minha mulher e minha filha estão à minha espera...
Ele cai sobre a cama, soluçando, com o coração despedaçado.
Volto-me para o capitão, que fica imóvel, sem proferir uma palavra. Há dores que exigem o silêncio. Mas nós compreendemos - temos que ficar com esses quando os outros tiverem partido.
Depois de ajudar uns a recomeçar a vida, temos de ajudar outros a morrer.
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Péan entre um grupo de liberados.
Naquela sexta-feira santa...
Sir Alexander Paterson, um eminente reformador social, escreveu a seguinte história a uma revista londrina:
"Quando desembarquei em Caiena, na sexta-feira santa de 1937, pareceu-me que tudo nessa terra falava da desolacão do Getsêmane e do Calvário e que nada me oferecia uma promessa de redenção, uma esperança de ressurreição...
Passando pela rua principal na manhã do domingo da Páscoa, encontrei o salvacionista Charles Palpant, residente na colônia em um pequeno sítio no flanco da colina, onde cultiva flores e legumes com o auxílio de alguns forçados libertados, dos mais jovens da Colônia Penal que ele agrupara ao seu redor.
Causou-me ele profunda impressão, pois era, de todas as pessoas que ali encontrei, o mais correto no vestuário e o mais modesto nas maneiras. Passamos o dia em sua casa; desculpou-se ele pela simplicidade do acolhimento. Repartiu comigo tudo o que tinha: um pedaço de bolo e uma garrafa de limonada. Foi uma comunhão pascal que jamais esquecerei, comunhão que dispensou ritos e cerimônias pelos quais habitualmente traduzimos nossa fé cristã.
Milhares de criminosos tiveram de ir a Caiena para descobrir o que era o inferno. Eu, porém, tive de ir a Caiena para melhor compreender Quem era Jesus Cristo."
Link - Procure "Charles Péan - Ilha do Diabo" no Google e encontrará informação a respeito; se em francês - "Charles Péan - Conquêtes en Terre de Bagne" - mais material ainda.
O trabalho salvacionista na França é conhecido pelo ministério da filha do Fundador, Catherine Booth, La Marèchale" (o livro em português sobre sua vida e trabalho foi publicado pela Editora Betânia). A obra social desenvolvida no país é igualmente conhecida e respeitada. Na foto, o Palais de la Femme, grande edifício antigo que oferece acomodação a mulheres que trabalham ou que estudam. Visitei o suntuoso lugar em 1973, quando vim pela primeira vez à Europa e fiquei hospedado na Maison du Jeune Homme. Em 2001, na minha segunda e última visita a Paris, fui hospedado na Maison du Homme, um enorme e moderno edifício que abriga homens sendo reabilitados do alcoolismo ou das drogas. Fiz algumas refeições com eles, o que foi uma experiência e tanto, só não maior pelo meu "francês quebrado". Acima na foto, o albergue noturno no rio Sena que abriga muitos homens pobres de Paris, barco recentemente renovado.
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Tendo visitado ao longo de meu ministério muitos presídios para levar as boas novas do Evangelho aos detentos, em 1975, dirigindo o Corpo de Rio Grande-RS - cidade onde nasceram nossas duas filhas - montamos uma peça teatral baseada na poesia de um grande admirador do trabalho do Exército de Salvação, o pastor batista Mario Barreto França. Sinta ao ler o drama e também a ternura de sua poesia.
Sugestão:
Nos anos 50 e 60 muitas jovens que tinham facilidade de decorar longos trechos declamaram esta comovente poesia em ocasiões especiais em igrejas ou escolas, quem sabe até em reuniões entre presidiários. Fica a sugestão a algum leitor a que isso se repita quem sabe para o conforto de muitos.
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Em 2004, um grupo do meu Gospel Choir visitou o presídio de Helsinki, levando música aos detentos. Após a apresentacão, os jovens conversaram com os presentes. No grupo, finlandeses, eu de brasileiro e intercambistas, uma lituana, uma chinesa e uma judia americana. Os jovens nunca haviam entrado em um presídio.
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Disse Jesus:
"... Estava... preso e fostes ver-me.
... Sempre que o deixastes de fazer a um desses mais pequeninos, a mim o deixastes de fazer."
(Leia toda a passagem bíblica de Mateus 25:31-46)
Olá Senhor Paulo,
ResponderExcluirEstou comovida com o texto do senhor Mário B. França. Lindo, profundo e totalmente aliviador! Vemos que Deus esta conosco nos momentos em que acreditamos estar sozinhos. Sempre perdemos a chance de entender que Ele nunca nos deixa só. Precisamos passar por momentos de muita dor e desespero para ver?
Quando o senhor fala da Ilha do Diabo eu estremeço, pois li o livro e sofri junto com aqueles homens a total devastação de idéias, conceitos morais, dignidade! Pergunto-me, como alguém conseguiu sair daquele lugar? Como resistiu? Só uma fé muito grande no Pai poderia dar a força suficiente para tal façanha!
Senhor Paulo, parabéns! Seu Blog é sempre uma fonte impressionante de informação e de exemplo de compaixão. E não existe maior valor para um ser humano do que saber que sente e tem o sentimento de compaixão.
Espero também, que alguém consiga levar aos corações doloridos e solitários um pouco do sentimento que sai do poema. Compaixão, amor ao próximo, solidariedade...enfim, Fé na Vida que Deus Todo Poderoso nos Dá por que ELE sabe o que precisamos!
Meu muito obrigado e parabéns!
Um grande abraço.
Maria
Caro amigo Paulo ,nossa que bacana poder conhecer Alcatraz (conhecia pelos filmes)e os maravilhosos depoimentos também.
ResponderExcluirObrigado amigo por sempre nos presentear com assuntos interessantes,inteligentes,cultura
is e levar a palavra de Deus em tudo que você faz.
Um abraço...
Adorei o seu blog. É uma pessoa muito organizada. Excelente! Está de parabéns mesmo! Estou apaixonada pelas grandes e experientes histórias da sua vida e da sua família. Grande abraço pra vocês!
ResponderExcluirC.R.
Muito obrigada por postar a poesia. Minha mãe tem 71 anos. Em comemoraçãoao aniversário, ela declamou todo o poema na igreja. Ela não tem mais o livro e pediram a poesia. Encontrei aqui. Pretendo Imprimir e dar a ela de presente.Abraços
ResponderExcluirQ coisa mais linda esse post!
ResponderExcluirnossa, muito legal mesmo, parabéns!
ResponderExcluirAlcatraz tem histórias cruentas e violentas, no entanto sempre existe a esperança da regeneração como ocorreu com Robert Franklin Stroud, O HOMEM DE ALCATRAZ- personificado por Burt lancaster em filme homônimo de 1962.
ResponderExcluirImpressiona sua história, pois Stroud tinha tudo para se rebelar ao longo de seu tempo em Alcatraz, mas ao invés, ele se dedicou (e isto autodidaticamente) ao estudo dos pássaros.
Da personalidade violenta que tinha de outrora, passou a se tornar calmo e equilibrado, mas passou até o fim de sua vida na prisão, e morreu um dia antes do assassinato de John Kennedy, na idade de 73 anos, tendo sido preso durante os últimos 54 anos de sua vida, dos quais 42 estavam em solitária. Ele estava estudando francês perto do fim de sua vida.
Saudações!
Paulo Telles
Linda postagem! Maravilhosa e tocante a poesia de Mário Barreto França!
ResponderExcluirAbraço,
Abigail
É FASCINANTE,LER AS POSTAGENS E AS FOTOS ,IMAGINANDO EU LÁ NO LUGAR.PARABÉNS TENHO APREENDIDO MUITO OM SUAS PUBLICAÇÕES.ABRAÇOS.ENEIDA
ResponderExcluirPrimo Paulo, fizestes um belo relato muito bem ilustrado. Um fato bom foi saber que nunca houve uma execução em Alcatraz.
ResponderExcluirUm ponto pitoresco foi ver a Russian Hill com ajardinamento diferente, as Painted Laden com outras cores, mas os Cables Car iguais, provavelmente os mesmos.
Eu só não imaginava ver tantos moradores de rua, mais do que jamais imaginei ver, mais do que já vi em qualquer lugar do Brasil, felizmente, mas mais bem estruturados do que os nossos.
Parabéns por mais este belo post.
Sérgio Santi