Paulo Franke

09 fevereiro, 2025

ReveR - Sob a sombra sinistra do nazismo

 


  À sombra sinistra do nazismo


Tenho inúmeros pequenos textos sobre histórias "à sombra do nazismo". São em sua maioria histórias que provam que em meio à guerra e destruição sentimentos humanitários, portanto belos, afloraram em um contraste digno de nota. Muitos, não todos, têm o Exército de Salvação (o exército cuja única arma é o amor), igreja na qual sirvo a Deus desde a minha juventude, como fundo e alguns ligados a líderes salvacionistas que passaram pelo Brasil.


GilBERT ABADIE foi o chefe nacional de nossa obra dos anos de 1957 a 1965, período em que nossa trabalho conheceu um grande avanço. Tendo ingressado no Exército em 1962, cheguei a conhecê-lo pessoalmente, inclusive visitando o casal em sua aposentoria na Inglaterra. Abadie, sentado, aparece com sua esposa, à direita Bruno Behrendt e sua esposa, que o sucedeu na liderança da obra no Brasil, e também Carl Eliasen, o diretor do Colégio de Cadetes, que preparava oficiais; na sessão de 1964-1965 entre esses cadetes eu.

Tendo sido militar no exército francês durante a Segunda Guerra Mundial, Abadie foi feito prisioneiro  dos alemães. Ele aproveitou esse tempo para testemunhar de sua fé cristã, meditar, celebrar cultos para os seus companheiros de infortúnio,  estudar a Bíblia e aprender noções básicas do grego. Um dos seus escritos resumido sobre  experiências como prisioneiro pode ser lido abaixo:


"Havia no campo um grupo de prisioneiros evangélicos, cerca de 150 homens. Deus havia colocado nos seus corações o desejo de ganhar seus companheiros de cativeiro para Cristo. O Natal era uma oportunidade de aumentar o círculo dessa congregação peculiar,  onde não havia mulheres nem crianças.

Naquele Natal de 1944, esses desventurados cristãos tomaram uma decisão que parecia sem sentido: cada um deles convidaria um camarada não-pertencente à fé evangélica e ofereceria minúsculos sanduíches e um copo de leite com chocolate. Jamais esquecerei esse encontro onde foi demonstrado o amor cristão pelos demais com o triunfo sobre o egoísmo. Quando os convidados saíram, uma estranha alegria, doce e agradável, reinou entre eles. Foi uma celebração natalina em que o próprio Cristo esteve presente."

BRUNO BEHRENDT, que já trabalhava como missionário no Brasil durante a guerra, contava-nos que sua mãe, salvacionista na Alemanha, em meio às privações inimagináveis, procurava cascas de batata para fazer sopa para os miseráveis. Na gestão de Behrendt, fui nomeado, em 1966, certamente pelo meu sobrenome alemão, para a cidade de Joinville-SC.

Nota - Sou feliz em dizer que meus antecedentes Frankes foram para o Brasil 100 anos antes do advento do diabólico nazismo.

GERBEN STELSTRA, um oficial salvacionista holandês, recorda-se do Natal de 1945, em Lubeck, Alemanha, poucos meses após o fim da guerra. "Comprimidos dentro de seus barracos, os refugiados não conseguiam aquecer-se e nada lembrava o Natal de outros tempos. No ar, o cheiro da iluminação a gas e de desinfetante. Amontoados, poloneses, iugoslavos, húngaros, russos; os escandinavos e os holandeses procuravam qualquer enfeite para decorar o ambiente. Os luteranos descobriram um pequeno arbusto que escapara do fogo e o enfeitaram. O lugar onde festejaríamos o Natal seria em um pequeno Corpo salvacionista em Lubeck, milagrosamente ainda em pé, outrora um salão relevante, agora com as  portas e janelas em pedaços ou faltando totalmente, pelas quais passava o frio intenso. Na plataforma, uma espécie de fanfarra composta por homens usando uniformes esquisitos da Wehrmacht, cujas insígnias haviam sido descosturadas, juntavam-se a salvacionistas britânicos e canadenses. No salão, prisioneiros de guerra, soldados das forças de ocupação e refugiados esfarrapados cantavam "Noite de paz, noite de amor", enquanto uma luz tênue de pobres velas iluminava de forma estranha os rostos sofridos daqueles homens e mulheres. Enquanto cantávamos o hino, trouxeram uma dezena de homens em cadeiras de roda para o lugar reservado na frente do salão. reunião prosseguia. Eu me exercitava constantemente na mensagem bíblica, pois serviria de intérprete simultâneo. 

O momento crucial foi o fim da reunião, na hora em que se deu a oportunidade para pessoas virem à frente orar.Ali, miraculosamente, meu ódio foi eliminado. Um piloto da Luftwaffe, com as duas pernas amputadas, fez-me sinal para que alguém fosse orar à frente junto com ele. Ajoelhar-se, como é o costume, seria impossível para ele, pois não tinha mais seus joelhos. Dirigi-me até sua cadeira de rodas e orei com ele. Assim, o Senhor derreteu meu rancor como o sol a neve. Foi um momento santo  e inesquecível no Natal de 1945 e sempre que dele me recordo a emoção me abala."



1983. Trabalhávamos Anneli e eu no departamento editorial do Quartel Nacional em São Paulo, quando o Exército de Salvação do Brasil recebeu a visita de um oficial de nacionalidade alemã e de sua esposa, que é vista na foto sendo interpretada, do inglês para o português, por minha esposa. Meu sogro, à esquerda, era o segundo em chefe e Carl Eliasen, à direita, na época o líder nacional de nossa obra, proveu-me de uma interessante história contada pelo visitante:

"Tte. Coronel FLADE e Sra. Dona Ursula, excelentes visitaantes que contaram histórias maravilhosas.  Os visitantes internacionais que passaram pela guerra estavam do lado dos aliados, assim foi muito bom ouvir também algo 'do outro lado'. O Coronel Flade contou-nos que como jovem oficial salvacionista teve que servir no exército militar alemão. Devido às suas convicções, foi destacado ao corpo de enfermeiros. Certa vez, quando trabalhava em uma enfermaria, escutou um som que vinha de uma cama onde um soldado ferido, das forças aliadas, estava deitado. Tratava-s da melodia de um coro cantado no Exército de Salvação no mundo inteiro: `Sou feliz, sou soldado nas fileiras de Cristo´... Flade respondeu, assobiando a continuação do coro:`Aleluia! Sou feliz ...´ – Logo veio do leito o eco final: `Sou soldado de Jesus!´. Estabeleceu-se assim um contato, quando ambos identificaram-se como salvacionistas, e surgiu uma maravilhosa comunhão, embora, por estarem em campos contrários, tivessem que tomar cuidado, pois eram vigiados, particularmente pelo médico-chefe da equipe nazista.”


Em 1973, com um grupo de colegas de 25 países do Colégio Internacional para Oficiais (ICO) em Londres, visitamos certo dia a cidade de Coventry, a famosa cidade de Lady Godiva. Momento tocante foi a visita à catedral e Coventry, cujas ruínas dos bombardeios nazistas foram preservadas e situam-se ao lado da nova e moderna catedral. No altar, atrás de uma cruz tosca, as palavras de Jesus: "Pai, perdoa..."


Na foto, tomada no final do curso, apareço com o chefe mundial do The Salvation Army, na época o sueco ERIK WICKBERG. Anos mais tarde na revista "O Oficial", publiquei uma história ligada a ele e intitulada "O Serviço 'Secreto' do General Wickberg":

"Foi em 1933 e o capitão Wickberg, de 29 anos, 
trabalhava na Áustria. Naquela época, o trabalho 
salvacionista na Áustria era supervisionado pela Alemanha, com o quartel-general em Berlim. Devido à tensão existente antes do Anschluss, quando Hitler invadiu a Áustria, não era fácil para os alemães obterem vistos de saída. 
Sendo que Wickberg possuía o passaporte sueco, de um país neutro, foi-lhe pedido por seu superior realizar uma tarefa delicada que exigia coragem.

"Certos rumores precisavam ser investigados e decisões importantes deveriam ser tomadas. Como o contato com Berlim não seria possível, Wickberg foi a Viena no lugar de seu líder, com a autoridade da sede da obra em Londres para apoiá-lo. E assim os temores foram confirmados.
Descobriu-se que um tenente salvacionista era membro do partido nazista e usava o uniforme das tropas de storm. Wickberg imediatamente desfez a nomeação do tenente e o enviou para casa, na Alemanha, no primeiro trem disponível."

Em 1933, Adolf Hitler chega ao poder na Alemanha. EINSTEIN, judeu, encontra-se agora em perigo. É avisado por amigos de que há planos para o seu assassinato e é aconselhado a fugir. Einstein renuncia mais uma vez à cidadania alemã.
A 7 de outubro de 1933, Einstein parte do porto de Southampton em um navio para os Estados Unidos, o seu novo lar. 
Nesta rara foto ele posa junto a uma banda do Exército de Salvação de Los Angeles na Rose Parade, em Pasadena-CA. Albert Einstein (1879-1955) declarou: "Sem a convição de uma harmonia íntima do universo, não poderia haver ciência".
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A foto é a oficial do cinquentenário do Curtume Julio Hadler S/A, onde trabalhou meu pai, Darcy Franke, desde os primeiros anos de sua juventude, até chegar à diretoria. Nela ele aparece diante da corbeille do meio, enquanto meu avô, Germano Luiz Franke, e outro tio-avô, Carlos Franke, também são vistos na primeira fila. Entre os operários, muitos descendentes de alemães. No início da guerra, decretado pelo presidente Getúlio Vargas, houve o dia do quebra-quebra a tudo o que fosse de origem alemã, sendo o curtume atingido com grandes perdas materiais, o que meu pai nos contava. Em 1959, o curtume foi também meu primeiro trabalho, como office-boy, até 1964, quando, como auxiliar de contabilidade, parti para o Colégio de Cadetes do Exército de Salvação em São Paulo.


Nasci em 1943, durante a guerra, e nesta foto, uma das únicas que tenho daquele tempo, apareço com minha prima Liana Treptow e minha irmã Neiva, sentada. Costumo comentar que enquanto Hitler berrava seus discursos do outro lado do mundo, eu berrava meu choro infantil no meu berço, certamente à luz de vela, pois no sul do Brasil havia blackouts frequentes durante alguns anos da guerra, diante do temor de bombardeios nazistas.


A "Folha do Brasil", jornal do Rio de Janeiro, edição do dia 21 de agosto de 1938, dos recortes que meu pai nos deixou, há a notícia de que o chanceler Adolf Hitler estava tendo um romance com Winifred Wagner, filha do compositor alemão. Em um ano a guerra começava.



Em 2001, em busca de minhas raízes na Alemanha (ver postagem a respeito), visitei em Berlim as ruínas da Gestapo. Aqui, poso ao lado do poster do teólogo-mártir DIETRICH BONHOEFFER, que passou por ali antes de ser morto por enforcamento por sua oposição ao nazismo.

De alguma forma, Dietrich foi influenciado pelo Exército de Salvação em sua juventude. Na biografia do grande homem de Deus, Edwin Robertson cita que ele foi muito tocado pela alegria e comprometimento a Jesus Cristo dos salvacionistas durante um congresso em Berlim dirigido pelo general Bramwell Booth, filho do fundador William Booth.

Um DVD imperdível, que ganhou o prêmio de melhor filme no festival de Monte Carlo. Uma história verídica de amor, coragem e sacrifício.

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