Paulo Franke

09 junho, 2012

Cruzeiro pela Lagoa dos Patos-RS nos anos 40 e 50...

Já que estou na onda de navios, continuo na rota das postagens sobre o assunto, do tipo saudosista desta vez.


Há um bom tempo tenho procurado uma foto do navio Cruzeiro, aquele que navegava pela Lagoa dos Patos-RS, servindo tanto de transporte de cargas como também de entretenimento a passageiros nos anos 40 e 50, principalmente. Tive a surpresa recente de receber de um bom amigo a foto do mesmo. Então chegou a hora de escrever sobre ele, de uma forma diferente, tipo reunindo experiências e reminiscências de pessoas que foram seus passageiros, o que não foi o meu caso.



 Dele eu me lembro quando, com meus padrinhos, fui ao porto de Pelotas esperar os meus pais que chegavam de Porto Alegre. Associo o acontecimento com uma cicatriz que tenho no rosto desde menino - acho que ainda não se "dava pontos" naquele tempo - adquirida no sítio de meus padrinhos, onde fiquei enquanto os pais viajavam, ao cruzar, correndo e brincando, um eucaliptal onde havia uma cerca de arame farpado que eu não vi... Resumindo, fui ao porto esperá-los com o rosto tomado de esparadrapos. Outras lembranças do que contavam meus pais era uma bandinha que tocava para os passageiros que embarcavam, acho que no porto da capital: "Ai, ai, ai, ai, está chegando a hora, o dia já vem raiando, meu bem, e eu tenho que ir embora"... Meu pai contava da beleza do Farol de Itapuã, no rio Guaíba, antes de o navio começar a navegar na Lagoa dos Patos (a maior laguna do Brasil). E lembro-me de certa vez ter ido visitar minha avó, recém-chegada de uma viagem no Cruzeiro, adoentada pelo navio ter "jogado" muito, como se dizia na época. E só.


  

Meu amigo, que me conseguiu a foto, tem as suas próprias lembranças:
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Lembro-me de que saiu do porto de Pelotas mais ou menos às 22:00 horas. Atrasou no processo de carregamento. Daí foi a Rio Grande onde carregou (ou descarregou?) mais alguma coisa por lá. Já madrugada “zarpou” rumo a Porto Alegre onde chegou ao entardecer do dia, com chuva “fininha”. Meu tio nos esperava no porto com uma pequena caminhonete Renault. Viajamos a mãe, minha irmã e eu. O pai tinha compromisso nas paróquias de Pelotas e não foi conosco. Lembro-me de que, a meu pedido, ele preparou linha (de algodão) com anzol e bóia. Eu devia ter uns nove anos. Consegui uns pedaços pequenos de carne com o pessoal da cozinha do Cruzeiro. Isquei o anzol e o “lancei ao mar”. Estava no porto de Rio Grande. Para minha decepção o anzol fez uma curva descendente e encostou no casco do navio. É lógico que nenhum peixe se atreveu a encará-lo. Se isso acontecesse.. o que eu faria? 
Era realmente um pequeno cargueiro com umas 4 ou 6 cabines (4 beliches e um lavatório) onde se acomodavam os eventuais passageiros. Hoje em dia o mesmo navio continua navegando, depois de adaptado para transportar óleo entre a REFAP e Rio Grande. (EGW)
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Pois eu viajei no Cruzeiro! Não me atrevo a dizer, mas acho que tinha 5 anos. O suficiente para lembrar de andar pelo convés com minha mãe e meus irmãos. Não sei como ela cuidava de 4, um deles com 3 anos!   Lembro-me um pouco das cabines, simples, nada luxuosas. Mas era uma viagem curta pois saía de Pelotas em tôrno de 7 horas, depois de algum tempo já era noite e após jantar íamos dormir... Quando se chegava a Porto Alegre, o dia já havia amanhecido... Claro que para nós crianças era algo muito legal, uma novidade!  (GB)

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E um depoimento mais substancial vem de um tio:


Atendendo ao teu pedido, e "puxando" pela minha memória, tento relembrar as minhas viagens no "rápido e confortável navio motor Cruzeiro" como era anunciado nos jornais da época, ou seja, lá nos anos 1948 e 49, quando vim estudar em Porto Alegre.


A saída do cais do porto aqui na capital era às 11h00 com apitos do navio e abanos de amigos e parentes que iam ao "bota-fora" dos viajantes.


No percurso pelo Guaíba até Itapoã - 60km - apoiados nas amuradas da embarcação, íamos apreciando a paisagem da orla do rio (ou lago como se chama atualmente o Guaíba) durante cinco horas aproximadamente. Após entrarmos na Lagoa dos Patos só víamos a água, pois as margens desapareciam dada a distância em que ficavam. 


Em geral a viagem que eu fazia era nas férias de julho, ocasião em que vários estudantes usavam este meio de transporte e aí tínhamos com quem conversar e, às vezes, até "namorar".


Lá pelas 16h00 chegava a noite e, pouco depois, era a hora de jantar e não muito mais a de nos recolhermos para dormir em um camarote de duas pessoas.


Ao acordarmos, por volta das seis horas da manhã, o "rápido navio" estava atracando no porto de Rio Grande, onde descarregava parte da carga e dos passageiros. Ali permanecia cerca de três a quatro horas quando, então, seguia para Pelotas, percorrendo parte da lagoa e do Canal de São Gonçalo em mais ou menos quatro horas.


Lá chegando, éramos recebidos pelos familiares, se não me engano em um cais de madeira junto ao porto novo. Era o fim de uma longa viagem de vinte e quatro horas, aproximadamente.






Como já fazem cerca de 64 anos, é possível alguma diferença entre os dados acima com os verdadeiros, mas não muita.
Obs.: o referido "navio" destinava-se mais a cargas do que a passageiros cujo mínimo, creio, não passava de vinte. Outrossim, lembro que uma viagem de ônibus levava cêrca de 12 horas.


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Farol do Itapuã, palavra indígena que significa "ponte de pedras sobre as águas". Foto: Helga Altmayer Gonçalves (1945)





Foto Wikipedia de satélite da Lagoa dos Patos que se une à Lagoa Mirim através do Canal de São Gonçalo.
Quando que naquele tempo poderia imaginar-se tal coisa, digo, uma foto de satélite? 




Foto: Christiane Salomoni



Meu pai, que com o tio que me forneceu o valioso relato, construiu um barco pequeno no 
qual navegavam pela Lagoa dos Patos - quando a família aumentou adquiriu uma lancha. Ele aparece em terra com seu chapéu estilo missionário africano; na pôpa sua irmã, casada com o tio que está ao remo. Aparecem também minha mãe, na sombra com meu irmão no colo, uma outra irmã de meu pai e sua filha sentadas (seu esposo certamente tirando a foto), minha irmã mais velha de tranças sentada elegantemente (ver foto seguinte) e eu com a mão na água... (tente ampliar com um clique sobre a foto para vê-la melhor).



Na década de 90 preseentei minha irmã mais velha -  que vive na praia do Laranjal, junto à Lagoa dos Patos - com esta "carta oceanográfica", que por sua vez foi a mim presenteada na cabine de comando de um navio cargueiro, que nos levava como passageiros para a Finlândia. A foto mostra o Canal São Gonçalo, a praia do Laranjal, a cidade de Pelotas e a de Rio Grande no acesso ao Oceano Atlântico (parte inferior).


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Pedido certamente para poucos...

Se você ou algum parente seu já fez a referida viagem no Cruzeiro, sejam bem-vindos a contar algo a respeito nos Comentários após esta postagem.


Divulgue, pois este é um documento raro na Internet!


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L i n k


"A ver navios?" Não, os navios que eu vi!

http://paulofranke.blogspot.fi/2009/05/navegacoes.html

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Próxima postagem:


Lambrettas... Vespas... Motos...


(inclusive foto de Audrey Hepburn em uma Vespa carregando o assustado Gregory Peck no filme "A Princesa e o Plebeu")


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4 Comments:

  • Este é o meu amigo e irmão Paulo Franke! Sempre rebuscando no passado, cenas que trazem prazer e alegria a todos nós. E, nesta foto específica, aos queridos gaúchos de Porto Alegre, Pelotas e Rio Grande, tchê!
    B.S.Calegari

    By Blogger paulofranke, at sábado, junho 09, 2012 7:09:00 PM  

  • Paulo,
    Havia o "Cruzeiro" e o "Jeny Naval". Um saía as quartas e o outro no sábado.
    Como é bom ser antigo!!!
    SDS (Facebook)

    By Blogger paulofranke, at domingo, junho 10, 2012 9:30:00 AM  

  • Que memória a do teu tio, heim! Muito legal tb o teu cuidado em guardar e reproduzir o texto, que muito enriqueceu a postagem. Pena não haver mais esse cruzeiro. Comparava, oportunamente, com o belíssimo passeio que acabei de fazer no delta do Rio Paraná (Buenos Aires), local ainda tão preservado, e bem explorado turisticamente.

    By Anonymous Francisco S V Filho, at quarta-feira, junho 13, 2012 12:42:00 AM  

  • Prezado Paulo Franke, boa noite.
    Com imensa emoção visito tua página pela primeira vez.
    Meu avô materno, meu padrinho, foi chefe de máquinas do Navio Cruzeiro por quase 50 anos.
    Muito viajei com ele no Cruzeiro.
    Compartilho convosco a emoção.
    ABRAÇÃO FRATERNO.

    By Blogger paulo Ricardo, at sábado, fevereiro 13, 2021 2:31:00 AM  

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