Paulo Franke

29 abril, 2023

ReveR - sábado, 29.04.23 - O Exercito de Salvacão no nazismo (reprisando)

  À Sombra Sinistra do Nazismo

1a. parte

Como tenho inúmeros pequenos textos sobre histórias "à sombra do nazismo", decido publicá-los no meu blog ocasionalmente, começando com esta postagem. São em sua maioria histórias que provam que em meio à guerra e destruição sentimentos humanitários, portanto belos, afloraram em um contraste digno de nota. Muitos, não todos, têm o Exército de Salvação (o exército cuja única arma é o amor), igreja na qual sirvo a Deus desde a minha juventude, como fundo e alguns ligados a líderes salvacionistas que passaram pelo Brasil.


Gilbert Abadie foi o chefe nacional de nossa obra

 dos anos de 1957 a 1965, período em que nossa 

trabalho conheceu um grande avanço. Tendo 

ingressado no Exército em 1962, cheguei a

conhecê-lo pessoalmente, inclusive visitando o 

casal em sua aposentoria na Inglaterra.

 Abadie, sentado, aparece com sua esposa, à 

direita Bruno Behrendt e sua esposa, que o 

sucedeu na liderança da obra no Brasil, e também 

Carl Eliasen, o diretor do Colégio de Cadetes, que 

preparava oficiais; na sessão de 1964-1965 entre 

esses cadetes eu.


Tendo sido militar no exército francês durante a 

Segunda Guerra Mundial, Abadie foi feito 

prisioneiro  dos alemães. Ele aproveitou esse 

tempo para testemunhar de sua fé cristã, meditar, 

celebrar cultos para os seus companheiros de 

infortúnio,  estudar a Bíblia e aprender noções 

básicas do grego. Um dos seus escritos resumido 

sobre  experiências como prisioneiro pode ser lido 

abaixo:


"Havia no campo um grupo de prisioneiros

evangélicos, cerca de 150 homens. Deus havia 

colocado nos seus corações o desejo de ganhar 

seus companheiros de cativeiro para Cristo. O 

Natal era uma oportunidade de aumentar o círculo 

dessa congregação peculiar,  onde não havia 

mulheres nem crianças.

Naquele Natal de 1944, esses desventurados 

cristãos tomaram uma decisão que parecia sem 

sentido: cada um deles convidaria um camarada 

não-pertencente à fé evangélica e ofereceria 

minúsculos sanduíches e um copo de leite com 

chocolate. Jamais esquecerei esse encontro onde 

foi demonstrado 

o amor cristão pelos demais com o triunfo sobre 

o egoísmo. Quando os convidados saíram, uma 

estranha alegria, doce e agradável, reinou 

entre eles. Foi uma celebração 

natalina em que o próprio Cristo esteve presente."


Bruno Behrendt, que já trabalhava como 

missionário no Brasil durante a guerra, contava-

nos que sua mãe, salvacionista na Alemanha, em 

meio às privações inimagináveis, procurava 

cascas de batata para fazer 

sopa para os miseráveis. Na gestão de Behrendt, 

fui nomeado, em 1966, certamente pelo meu 

sobrenome alemão, para a cidade de Joinville-SC.



Gerben Stelstra, um oficial salvacionista 

holandês, recorda-se do Natal de 1945, em 

Lubeck, Alemanha, poucos meses após o fim da 

guerra.

"Comprimidos dentro de seus barracos, os 

refugiados não conseguiam aquecer-se e nada 

lembrava o Natal de outros tempos. No ar, o 

cheiro da iluminaçãoa gas e de desinfetante. 

Amontoados, poloneses, iugoslávos, húngaros, 

russos; os escandinavos e os holandeses 

procuravam qualquer enfeite para decorar o 

ambiente. 

Os luteranos descobriram um pequeno arbusto 

que escapara do fogo e o enfeitaram.

O lugar onde festejaríamos o Natal seria em um 

pequeno Corpo salvacionista em Lubeck,

milagrosamente ainda em pé, outrora um salão 

relevante, agora com as  portas e janelas em 

pedaços ou faltando totalmente, 

pelas quais passava o frio intenso. Na plataforma, 

uma espécie de fanfarra composta por homens 

usando uniformes esquisitos da Wehrmacht, cujas 

insígnias

haviam sido descosturadas,

juntavam-se a salvacionistas britânicos e 

canadenses. No salão, prisioneiros de guerra, 

soldados das forças de ocupação e refugiados 

esfarrapados cantavam "Noite de paz, noite de 

amor", enquanto uma luz tênue de pobres velas 

iluminava de forma estranha os rostos sofridos 

daqueles homens e mulheres. 

Enquanto cantávamos o hino,

trouxeram uma dezena de homens em cadeiras de 

para o lugar reservado na frente do salão. 

reuniãoprosseguia. Eu me exercitava 

constantemente na mensagem bíblica, pois 

serviria de intérprete simultâneo.

O momento crucial foi o fim da reunião, na hora 

em que se deu a oportunidade para pessoas virem 

à frente orar.

Ali, miraculosamente, meu ódio foi eliminado. Um 

piloto da Luftwaffe, com as duas pernas 

amputadas, fez-me sinal para que alguém fosse 

orar à frente junto com ele. 

Ajoelhar-se, como é o costume, seria impossível 

para ele, pois não tinha mais seus joelhos. Dirigi-

me até sua cadeira 

de rodas e orei com ele. Assim, o Senhor derreteu 

meu rancor como o sol a neve. Foi um momento 

santo  e inesquecível no Natal de 1945 e sempre 

que dele me recordo a emoção me abala.



1983. Trabalhávamos Anneli e eu no 

departamento editorial do quartel nacional em 

Paulo, quando o Exército

de Salvação do Brasil recebeu a visita de um

oficial de nacionalidade alemã e de sua esposa, 

que é vista na foto sendo interpretada, do inglês 

para o português, por minha esposa.

Meu sogro, à esquerda, era o segundo em chefe e 

Carl Eliasen, à direita, na época o lider nacional de 

nossa obra, proveu-me de uma interessante 

história contada pelo visitante:

"Tte. Coronel Flade e Sra. Dona Ursula, excelentes

visitaantes que contaram histórias maravilhosas.  

Os visitantes internacionais que passaram pela 

guerra estavam do lado dos aliados, assim foi 

muito bom ouvir também algo 'do outro lado'.


O Coronel Flade contou-nos que como jovem 

oficial salvacionista teve que servir no exército militar alemão. 

Devido às suas convicções, foi destacado ao 

corpo de enfermeiros. Certa vez, quando 

trabalhava em uma enfermaria, escutou um 

que vinha de uma cama onde um soldado 

feerido, das forças aliadas, estava 

deitado. Tratava-s da melodia de 

um coro cantado no Exército de Salvação no 

mundo inteiro, 

digamos: “Sou feliz, sou soldado nas fileiras 

de Cristo”... 

Flade respondeu, assobiando a continuação do 

coro:

“Aleluia! Sou feliz ...” – Logo veio do leito o eco 

final: “Sou soldado de Jesus!”. Estabeleceu-se 

assim um contato, quando ambos identificaram-

se como salvacionistas, 

e surgiu uma maravilhosa comunhão, embora, por 

estaremem campos contrários, tivessem que 

tomar cuidado, pois

eram vigiados, particularmente pelo médico-

chefe da equipe nazista.”

.

Em 1973, com um grupo de colegas de 25 países 
o Colégio Internacional para Oficiais (ICO) em Londres, 
visitamos certo dia a cidade de Coventry, a famosa cidade 
de Lady Godiva. Momento tocante foi a visita à catedral 
de Coventry, cujas ruínas dos bombardeios ñazistas
foram preservadas e situam-se ao lado da nova e moderna 
catedral. No altar, atrás de uma cruz tosca, as palavras de Jesus: "Pai, perdoa..."


Na foto, tomada no final do curso, apareço com o chefe mundial do The Salvation Army, na época o sueco Erik Wickberg. Anos mais tarde na revista "O Oficial", publiquei uma história ligada a ele e intitulada "O Serviço 'Secreto' do General Wickberg":

"Foi em 1933 e o capitão Wickberg, de 29 anos, 
trabalhava na Áustria. Naquela época, o trabalho 
salvacionista na Áustria era supervisionado pela Alemanha,
 com o quartel-general em Berlim. Devido à tensão existente 
antes do Anschluss, quando Hitler invadiu a Áustria, não 
era fácil para os alemães obterem vistos de saída. 
Sendo que Wickberg possuía o passaporte sueco, de 
um país neutro, foi-lhe pedido por seu superior realizar 
uma tarefa delicada que exigia coragem.

"Certos rumores precisavam ser investigados e decisões
importantes deveriam ser tomadas. Como o contato com 
Berlim não seria possível, Wickberg foi a Viena no lugar de 
seu líder, com a autoridade da sede da obra em Londres para
apoiá-lo. E assim os temores foram confirmados. Descobriu-se
que um tenente salvacionista era membro do 
partido nazista e usava o uniforme das tropas de storm.
Wickberg imediatamente desfez a nomeação do tenente 
e o enviou para casa, na Alemanha, no primeiro trem disponível."

Em 1933, Adolf Hitler chega ao poder na Alemanha. Einstein, judeu, encontra-se agora em perigo. É avisado por amigos 
de que há planos para o seu assassinato e é aconselhado a fugir. Einstein renuncia mais uma vez à cidadania alemã.
A 7 de outubro de 1933, Einstein parte do porto de Southampton em um navio para os Estados Unidos, o seu novo lar. 
Nesta rara foto ele posa junto a uma banda do Exército de Salvação de Los Angeles na Rose Parade, em Pasadena-CA. Albert Einstein (1879-1955) declarou: "Sem a convição de uma harmonia íntima do universo, não poderia haver ciência".

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2a. parte

A foto é a oficial do cinquentenário do Curtume Julio Hadler S/A, onde trabalhou meu pai, Darcy Franke, desde os primeiros anos de sua juventude, até chegar à diretoria. Nela ele aparece diante da corbeille do meio, enquanto meu avô, Germano Luiz Franke, e outro tio-avô, Carlos Franke, também são vistos na primeira fila. Entre os operários, muitos descendentes de alemães. No início da guerra, decretado pelo presidente Getúlio Vargas, houve o dia do quebra-quebra a tudo o que fosse de origem alemã, sendo o curtume atingido com grandes perdas materiais, o que meu pai nos contava. Em 1959, o curtume foi também meu primeiro trabalho, como office-boy, até 1964, quando, como auxiliar de contabilidade, parti para o Colégio de Cadetes do Exército de Salvação em São Paulo.


Nasci em 1943, durante a guerra, e nesta foto, uma das únicas que tenho daquele tempo, apareço com minha prima Liana Treptow e minha irmã Neiva, sentada. Costumo comentar que enquanto Hitler berrava seus discursos do outro lado do mundo, eu berrava meu choro infantil no meu berço, certamente à luz de vela, pois no sul do Brasil havia blackouts frequentes durante alguns anos da guerra, diante do temor de bombardeios nazistas.


A "Folha do Brasil", jornal do Rio de Janeiro, edição do dia 21 de agosto de 1938, dos recortes que meu pai nos deixou, há a notícia de que o chanceler Adolf Hitler estava tendo um romance com Winifred Wagner, filha do compositor alemão. Em um ano a guerra começava.



Em 2001, em busca de minhas raízes na Alemanha (ver postagem a respeito), visitei em Berlim as ruínas da Gestapo. Aqui, poso ao lado do poster do teólogo-mártir Dietrich Bonhoeffer, que passou por ali antes de ser morto por enforcamento por sua oposição ao nazismo.

De alguma forma, Dietrich foi influenciado pelo Exército de Salvação em sua juventude. Na biografia do grande homem de Deus, Edwin Robertson cita que ele foi muito tocado pela alegria e comprometimento a Jesus Cristo dos salvacionistas durante um congresso em Berlim dirigido pelo general Bramwell Booth, filho do fundador William Booth.



Um DVD imperdível, que ganhou o prêmio de melhor filme no festival de Monte Carlo. Uma história verídica de amor, coragem e sacrifício. 

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L i n k 

Minhas visitas aos campos de concentração de Auschwitz-Birkenau, Treblinka e Sobibor, na Polônia, Bergen Belsen, na Alemanha, e Therezin, na República Tcheca:

Paulo Franke: ReveR - Campos de concentracão nazistas visitados

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ReveR de amanhã:

2 meditacões de meu livro "Edificacão Diária"

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